segunda-feira, 11 de janeiro de 2021

Papai Noel me Contou (coletânea de contos natalinos)

 Bom, sei bem que já estamos em meados de Janeiro e o Natal já passou, mas gostaria de postar aqui um conto que fiz para uma coletânea de contos natalinos que foi publicado no Wattpad. Confesso que venho atualizando minhas histórias por lá com mais frequencia que aqui, por isso insentivo a vocês, que ainda me acompanham, se puderem, migrarem para lá, onde terão mais atualizações das minhas histórias. Prometo não abandonar aqui completamente, mas assumo que só conseguirei me manter ativa por lá mesmo. Deixo aqui meu perfil: @NANDAcNeves.


Sobre esse conto, basicamente é o meu conto mais o conto de outros autores incriveis, deixarei a coletânea completa aqui também para que vocês possam ler todos os contos e sentir que o clima bom do natal ainda não passou kkkk : Link da Coletânea

Agora sim, conto a baixo:



As luzes de natal encantam a crianças e adultos. Mesmo já passando das 21 horas, a praça decorada com pisca-piscas, enfeites no formato de anjos, sinos e papai noéis de todos os tamanhos, e uma grandiosa árvore de natal com luzes de led que projeta diferentes padrões a todo instante, estava cheia de pessoas a tirar fotos da bela decoração. O coral de crianças não mais cantavam as músicas natalinas, mas os vendedores ambulantes continuavam ali, aproveitando a noite de grande movimento que antecede o natal. 



Pipoqueiros vendem sua pipoca salgada e doce, amendoins torrados e cocada. A noite não está quente, mas os vendedores de picolé gritam e disputam a clientela com seus sorvetes de sabores variados; porém os que mais estavam fazendo sucesso eram os vendedores de algodão-doce, que rapidamente vendiam seu estoque. No meio de todos esses vendedores, tem o João. 



O ano não havia sido fácil para ninguém. Para João, de 12 anos, moleque de pele negra e corpo franzino, muita coisa tinha mudado entre o dia primeiro de janeiro até hoje, dia 24 de dezembro. Sua mãe, Heloísa, que trabalhava dobrado como faxineira em um hotel durante a parte da manhã e nos finais de semana; e em um supermercado na parte da tarde e noite, agora trabalhava apenas no supermercado. O Hotel havia fechado as portas, deixando dezenas de desempregados desamparados. 



João, sua mãe Heloísa e sua avó, Dona Margarida, moram juntos num barracão de dois quartos, com um banheiro e uma mini cozinha na Comunidade Vila da Bandeira, no mesmo lugar também vive Milena, a irmãzinha de João, com seus 5 anos de idade. Milena é pequena demais para entender as dificuldades da vida... Enquanto João já sabia que nesse ano não receberia nenhum presente de natal, a irmãzinha sonhava com uma cozinha de brinquedo. 



Na noite anterior João escutara a mãe chorando por toda a noite, pois a mulher sabia que não poderia realizar o desejo da filha e que a pequena menina, provavelmente, ainda jovem, já perderia o doce e puro encanto pelo natal e pelo Papai Noel.



A meta de João era simples. Ele logo cedo saiu de casa sem dizer para onde ia, rumou até um supermercado de atacarejo e comprou 4 caixas de balas de goma com um dinheiro que ele passou o ano inteiro juntando. Se vendesse todas as balas, ele conseguiria ajudar a comprar pelo menos as panelinhas de plástico para a cozinha de brinquedo que a irmã tanto queria. Talvez, em alguma loja de camelô, ele conseguisse comprar também um fogãozinho simples de brinquedo, mas essa parte era apenas uma grande talvez.



Após passar o dia inteiro, ainda lhe faltava uma caixa para vender. Aquela estava sendo sua primeira vez como vendedor e demorou um pouco para que ele se soltasse o suficiente, mas a sua habilidade para venda havia melhorado muito nas últimas horas que se passaram. Entretanto, era difícil competir com tantas opções. Na maioria das vezes, ao se aproximar de possiveis clientes, eles o olhavam de cima a baixo, desconfiados do garoto negro e miudo com uma caixa de bala de goma na mão e chinelo de dedo nos pés. Alguns, mais contagiados pelo famoso gentil espírito natalino, compravam suas balas mais por dó do que por real vontade, mas estes eram poucos e uma meta que parecia simples de início, se mostrou ser bem mais complicada no final.



A felicidade ao vender sua última bala se dissipa pelo ar ao ser inundado pela frustração. Já é quase meia-noite e João percebe que já é tarde demais para surpreender sua irmã com um belo presente. Naquela hora as lojas já estavam todas fechadas, nem o ônibus nem o metrô mais rodam nesse horário. Então uma realidade ainda mais atormentadora lhe recai sobre a mente: Ele saiu cedo de casa, escondido, sem dizer a ninguém, nem mesmo um recado havia deixado, ele tinha a esperança de voltar fazendo uma surpresa para irmã e de sobra alegrar a sua mãe, mas agora Heloísa e Dona Margarida devem estar desesperadas, achando que ele desapareceu!João havia se metido em uma bela roubada! 



Sem poder pegar um ônibus, João inicia uma caminhada de 30 minutos da praça até sua casa. Ele tem medo, as ruas estão praticamente vazias, já que além de ser bem tarde, agora, a maioria das famílias já estão reunidas para a ceia de natal. 



Em sua jornada rumo a sua casa ele pensa numa desculpa para dar a sua mãe e sua velha avó, mas como explicar a loucura que tinha feito? Ele não queria que a mãe ficasse brava, tudo o que ele menos queria é que ela ficasse mais triste do que já estava. 



Envolto por pensamentos que não o levava a lugar nenhum, João não percebe o que está acontecendo até que tudo esteja perto demais. Um barulho de cascos batendo no chão de forma ritmada o segue. Ele olha para trás e não vê nenhum cavalo ou qualquer animal a andar ou galopar para que se justificasse aquele barulho, contudo algo chama sua atenção para o céu, um objeto que ele não consegue identificar, se aproxima dele. 



Antes mesmo de pensar no que pode ser, João já começa a correr desesperado. Ele não consegue entender o que é, mas sua primeira impressão é de que um pequeno avião ou helicóptero que está a cair, e se esse fosse o caso, ele estava perdido, pois por mais rápido que ele corra, o barulho segue em seu encalço. 



Ele lança um breve olhar para o alto de novo e novamente não consegue distinguir o que está a cair, só sabe que agora o objeto voador está muito próximo ao chão, e pior, muito próximo dele. Num último ato de esperança, envolto de adrenalina do seu instinto de sobrevivência, João se joga ao chão, se põe em posição fetal, fecha os olhos e aguarda pelo fim.



Seu desejo é que não haja dor, talvez ele escute uma explosão, barulho de vidros se quebrando, algo parecido... Enquanto pensa no pior que está por vir, ele também pensa em como esse dia tinha sido o pior de sua vida: a madrugada a escutar sua mãe chorosa... O dia inteiro de pé, quase que implorando para que comprassem suas balas de gomas... A frustração de conseguir o valor que precisava apenas quando já não pode mais comprar o presente da irmãzinha... E agora, para finalizar... A morte? 



Enquanto esperava pelo seu fim, ele sentiu algo tocar seu braço de leve. João grita. Não de dor, não há dor, mas de medo, medo por não saber o que sentirá depois, seria esse toque o primeiro dentre os que virão logo após? O primeiro toque que antecede o seu fim? – Garoto? - uma voz masculina fala quando finalmente, João, que ainda está em posição fetal, de olhos fechados, e trêmulo, para de gritar. 



Ao escutar a voz do homem João decide abrir os olhos. Ele se dá conta que ainda está no chão e que tudo a sua volta parece normal. Ele então aos poucos se desenrola e se põe sentado ali menos na calçada. Ele vê bem à sua frente o que parece ser um trenó com renas de chifres monumentais na cabeça; ele então olha para seu lado esquerdo e vê um velho homem, de barba branca volumosa que vai até a metade da sua barriga grande. Ele veste uma roupa vermelha e branca, tem no olho um monóculo e uma touca vermelha na cabeça. 



O homem está curvado, olhando João com atenção, mas mantém um sorriso simpático no rosto.



João pisca duas vezes, olha para o trenó e para o velho homem; pisca novamente, coça os olhos com suas mãos de dedos pontudos e volta a olhar o homem que se mantém imóvel. Ele torna a olhar o trenó com as renas, que estão quietas, porém prontas para puxar o que quer que fosse. Então no céu tem papai noel? - João se pergunta.



– Você me vê? - o velho tem uma voz grossa, porém ao mesmo tempo doce. João não responde de pronto. – Não me vê. - o velho conclui, se põe ereto e ruma para o trenó. 



João, boquiaberto, se levanta num pulo e isso chama atenção do velho, que interrompe sua caminhada até o trenó, e volta a fitar o garoto franzino. 

– Você me vê? Sabe quem eu sou? - o velho tenta novamente.

– Deus? - João arrisca. Ele sabe bem que aquele velho está a usar roupas de Papai Noel, mas se ele está morto, não tinha como ver alguém além do que Deus, não é? 

– Ho Ho Ho. - o homem ri com as mãos abraçando sua enorme pança. 

– Não seja bobo, menino. - o velho, ainda com um sorriso largo, se reaproxima de João e o toca na cabeça. – Me chamo Nicolau, ou São Nicolau de Bira, ou São Nicolau de Mira... Mas creio que você deve me conhecer como Papai Noel. - se apresenta. 



João o olha desconfiado e torna a entrar no "transe" de mirar ao trenó e ao velho de vermelho, intercaladamente. 

– Não é possível. - diz após longos minutos de análise.

– Eu sei... Eu entendo. - o homem suspira e também olha seu trenó de ponta a ponta. – Você não acredita em mim, não é? Pelo menos não mais. - ele faz uma feição triste, porém compreensiva.

– Acho que não... Quero dizer... Você é real, mas o Papai Noel não existe. - responde ainda confuso. 

– Mas se eu existo, e sou o Papai Noel, como o Papai Noel não existe? - o velho pergunta se tornando novamente bem humorado. 

– Você é só mais um dos milhões de Papai-Noéis que ficam por aí. Não passa de um velho fantasiado. - João se emburra e dá a entender que deixará o local e o velho para trás. 

– Ah! Acha que sou um dos meus amigos... Entendo. - o velho observa o garoto começar a se afastar. – E por acaso não me viste a voar? - pergunta e João para para pensar. 

– É só um truque. - dá de ombros.

– Quer testar? - o velho propõe. – Seria bom ter uma companhia hoje. Talvez possa até me ajudar, estou bem atrasado.


João olha para o velho com a sobrancelha esquerda erguida.

– Isso é algum tipo de sequestro? Minha mãe não tem dinheiro para o resgate. - João ainda está bem desconfiado. – Na verdade minha mãe não tem dinheiro nenhum. - pensar em sua mãe o deixa triste novamente e preocupado, afinal, sabe que a mesma deve estar pirando atrás dele, enquanto ele conversa com um doido vestido de Papai Noel.

– Nada disso. Não quero deixar nenhuma criança longe de sua família no dia de hoje... Inclusive, eu adoraria te dar uma carona até a sua casa... Está muito tarde para um menino na sua idade estar na rua sozinho. 

– E você pretende chegar com isso na minha rua? - João aponta para o trenó com um leve desdém. 

– Impossível! Mas obrigada pelo convite. – João se põe a andar novamente.

– Eu posso chegar a qualquer lugar com meu trenó. - Papai Noel responde. João revira os olhos e não para de andar. – Caso não tenha percebido, nem todos podem me ver. - o bom velhinho evidencia. 



João então para para observar a sua volta, não há muito movimento, mas alguns carros esporádicos passam pela rua e parecem não se impressionarem pelo grande trenó com renas reais paradas no meio da rua.



O garoto volta o seu olhar para o Papai Noel, logo agora que ele começava a acreditar no velho a sua frente, essa nova constatação o deixa desconfiado novamente. 

– Por que... Por que você me perguntou se eu estava te vendo no começo? - João relembra.

– Como eu disse, porque nem todos podem me ver. - Nicolau responde sem hesitar. – Eu te vi correndo e com medo, por isso parei, percebi que poderia ser por minha causa, mas eu tinha que me certificar... Tem tanta gente doida nesse mundo. - o velho gargalha no final. 

– E por que eu posso te ver? - continua o questionamento.

– Bom. - o bom velhinho abre um largo sorriso. – Isso significa que você é especial... Bem especial. - Papai Noel vai se empolgando ao dizer essas palavras. – Apenas pessoas de coração puro, de altruísmo aguçado e de alma evoluída podem me ver e me escutar. Infelizmente, até mesmo algumas crianças não são capazes de me ver... Adultos então... - finaliza. 

– Você é um fantasma? 

– Bom... Eu nasci há mais de 1.600 anos... Então... De certa forma, sim. - diz com um sorriso torto. 

– E essas renas? Também são fantasmas? 

– Ah, minhas renas... Não, elas são presentes. Elas foram dadas a mim para que eu as cuidasse e para que no dia de hoje eu pudesse cumprir minha missão. 

– E qual é a sua missão? 

– Ora! Qual é a minha missão? Presentar as crianças ao redor do mundo, levar a elas a felicidade! Dar-lhes algo que lhes faça feliz. - ele gesticula ao enunciar sua missão.João pensa no que dizer.


Primeiro ele fica maravilhado com tudo o que está acontecendo. Ele está vendo o Papai Noel, o verdadeiro! Mas depois ele se lembra de tudo o que passara no dia de hoje, se lembra de como lutou muito para apenas tentar garantir metade do presente que sua pequena irmã tanto desejava, e ao lembrar disso ele sente raiva. 

– Então você está fazendo um péssimo trabalho. - João diz e dá as costas ao Papai Noel.



O bom velhinho o vê se afastar com um pesar no coração, como ele gostaria que João entendesse que ele não tinha culpa se o Natal cada dia menos parecia justo com aqueles que pouco tem... 



João já está a uma quadra de distância de onde deixou Nicolau e suas renas quando uma luz acende em sua mente com uma ideia que seria capaz de resolver todos os seus problemas atuais. 



O garoto até tinha conseguido o valor almejado, mas neste momento nenhuma loja estaria aberta para que ele compre o presente de Milena, porém O Papai Noel está ali! Ele pode conseguir o presente de sua irmã! 



João volta correndo, quando o velho já se prepara para alçar voo novamente. 

– Papai Noel! Papai Noel! - o garoto grita para chamar sua atenção e impedir que o bom velhinho se afaste. O seu chamar dá resultado. 



O velhinho segura firme as rédeas que comandam as renas para que as mesmas diminuam a velocidade de sua decolagem.

– Venha garoto, pegue a minha mão! - Nicolau oferece uma das mãos a João, que se joga para agarrá-la no exato momento em que o trenó começa a sair do chão. O garoto então se joga dentro do trenó, que apesar de bonito, é bem mais duro do que parece.– Ho ho ho! Vamos voar meu bom garoto! - João sente uns trancos à medida que as renas começam a voar, levando com elas o trenó de madeira.


Puxões nada gentis se estendem por todo o momento até que eles ganham uma boa altura e assim se estabilizam. Sentado ao lado do velho gordo, João se perde na admiração por olhar a cidade sobre seus pés.



O vento frio em sua face não o incomoda, seus olhos estão tão vidrados a buscar por todos os detalhes; seu coração está acelerado, mas não há medo, apenas fascinação. 



Quando finalmente consegue se recompor, João fita à Papai Noel, e o velho percebe que o menino já está pronto para uma pergunta.

– Sabe? Só agora percebi que nem mesmo sei o seu nome. - tem que falar alto, pois a corrente de ar que passa sobre eles, devido a velocidade em que as renas puxam o trenó, faz com que o barulho de vento seja bem alto sobre seus ouvidos. 

– João. - o menino responde. 

– Ah, tens um belo nome, João. - Papai Noel sorri. – E onde vive? Preciso deixá-lo em casa. - diz, mas o garoto o ignora. 

– Papai Noel, posso pedir algo ao senhor?

– Claro! 

– Preciso que o senhor dê uma cozinha de brinquedo para minha irmã, posso pagar pelas panelas. - diz pegando o amontoado de notas e moedas do bolso de seu short largo.

– Ah, meu garoto... - Papai Noel inicia com um sorriso triste de canto. – Não posso te garantir que serei capaz de fazer isso. 

– Como não? Você não é Papai Noel? 

– Claro que sou... Mas não tenho uma fábrica com duendes que produzem brinquedos aos montões, caso essa seja a sua próxima pergunta. - já deixa claro. 

– Mas... Então como você presenteia as crianças? Você compra os presentes nas lojas? - ele não entende. 

– Não, nada disso... - a velocidade das renas diminui, mas seguem em uma boa altura. – Eu não dou presentes a ninguém. – Mas... - João nem mesmo sabe o que dizer.– Quando eu estava vivo, sim, eu presenteava a todas as crianças que conseguia no meu povoado, mas... Como você mesmo disse, hoje sou um fantasma, ou algo parecido com um. 

– Mas então para quê tudo isso? As renas, a roupa, você! - João se irrita. 

– Você mesmo disse que tinha uma missão, agora me diz que não! 

– Na verdade, eu não dou os presentes diretamente, apenas incentivo que pessoas especiais, pessoas como você, que são puramente boas e por isso podem me ver e escutar, presenteie as crianças por mim. - se explica. 

– Como assim? 

– Ao redor do mundo existem pessoas boas, pessoas que recebem minha visita, que me escutam, que atendem o meu chamado e fazem o que podem para presentear as milhares de crianças que não só precisam, como merecem receber um presente no dia de hoje. Contudo, nem todo mundo pode me ver, e nem todo mundo que me vê pode ajudar muito, mas os pedidos... Ah, os pedidos chegam aos milhares, são muitas crianças, mas poucos com coração puro. - lamenta. – Durante todo o mês, eu passo nas casas daqueles que sei que são capazes de me ver e sempre busco por novas pessoas bondosas; intercedo pelos pedidos dos que mais necessitam, para que nenhuma criança fique de mãos vazias... Aquelas crianças em que sei que os pais podem presentear, fico feliz, mas sei que muitas não tem isso, faço o que posso, as pessoas que me ajudam fazem o que podem também, mas... Isso é tudo. - sorri fraco ao ver a tristeza no olhar do garoto que agora pouco estava transbordando de felicidade. 

– Ainda estou a buscar pessoas que podem me ajudar, talvez eu ainda consiga algo, nunca desisto, até o último momento, tentarei. - o velho garante, mas é tarde demais, nada mais é capaz de animar João. – Moro na Vila da Bandeira. - ele responde sem ânimo.



Papai Noel entende, o menino não quer mais ficar ali e não se sente bem com a nova revelação. Nada deixa o velho mais triste que isso, ver uma criança triste na noite de Natal. 



Quando João se dá conta, ele já está em frente a sua casa. Sua mãe está com os olhos inchados na porta do barracão em que vive, as lágrimas impediram que ela percebesse a forma estranha com que o filho surge pela rua, mas ao vê-lo, ela corre em sua direção e o abraça forte.– Eu queria comprar o presente de Milena, mãe! - o menino se justifica, antes mesmo que a mãe tenha a chance de dizer alguma coisa. – Eu tentei. - A mãe não diz nada, o alívio por ver o filho só a faz chorar mais ainda, e enquanto isso ela o beija e o toca, para garantir que ele está bem.



                                                                                 ...



João passa a noite quase que em claro, só sente o sono dominar seu corpo quando o sol já começa a nascer.


O menino não sabe que horas são, mas a luz do dia já invade o quarto que divide com sua velha avó quando escuta um barulho de buzina vindo da rua.


Crianças gritam eufóricas e o ronco de um caminhão desperta a atenção de todos. João parte para a rua, lá, sua mãe, avó e irmã já se encontram a observar um jovem rapaz descer da boleia do caminhão e abrir a carroceria.


Brinquedos que nem mesmo foram embrulhados começam a sair aos montes de lá e vão diretamente para mão das crianças carentes do bairro.


Tímida, Milena se mantém junto a família observando a bagunça que se formou ali. O jovem rapaz, que descera do caminhão, pega uma caixa tão grande que o tampa por completo. Por não estar embrulhado é bem claro do que se trata: Uma cozinha de brinquedo completa, com pia, fogão, bancada, colheres, panelas, até mesmo uma mini batedeira. O homem deixa a caixa bem em frente a família de João. Milena pula de felicidade. Heloísa não sabe se ri ou se chora, Dona Margarida abraça ao rapaz desconhecido tão forte que o mesmo chega a perder o ar por alguns segundos.


Após receber agradecimento de todos, João se põe bem perto do benfeitor e sussurra uma pergunta.


– Como você sabia? - o rapaz benfeitor não hesitou em responder de volta.

– Papai Noel me contou.



 

segunda-feira, 14 de dezembro de 2020

Capítulo 8: Um Jogo de Mestres (Parte 1) (Red Blood Lipstick)






Segunda maior cidade do país em questão de densidade populacional e quarta maior cidade em relação a território, nessas condições, achar uma pessoa apenas pelo nome seria como procurar uma agulha no palheiro. Rosa provavelmente deveria ter pensado nisso antes de sair da ONG, ela poderia muito bem ter ao menos pegado a pasta de Lisa, com as informações que ela coletou, sem dúvidas lá teria pelo menos o lugar em que ele estava se hospedando na cidade. 


Rosa, em sua moto, está estacionada no estacionamento de um hipermercado, e ali ela procura pelas redes sociais qualquer dica de como encontrar o jornalista. Após ter que lidar com vários perfis trancados, ela finalmente encontra um perfil do instagram do jornalista que está aberto. 


Rafael tem poucos seguidores e segue muitas pessoas, com um total de 15 fotos sendo ⅓ de paisagens. Por sorte uma atualização nos stories feito há 6  minutos atrás dá a Rosa uma boa pista sobre por onde começar.


O dia tinha amanhecido muito bonito, o sol brilhava pomposo num céu azul sem nuvem alguma, a temperatura da parte da manhã é amena, em torno dos 25º, tudo convidava para um passeio ao ar livre e um dos pontos principais da cidade, o parque municipal, se tornou o ponto mais movimentado. Esta era a primeira vez que Rafael ia até lá desde que chegara a cidade, sua investigação estava ocupando grande parte do seu tempo, já que a maior parte dos casos que ele estava acompanhando tinham um desfecho desconhecido e por conta própria o jornalista tenta encontrar a resposta. 


Pessoas praticavam suas caminhadas e corridas, crianças brincavam no pequeno playground do parque e Rafael lê o jornal, a matéria que mais o chamava atenção era do empresário encontrado assassinado num quarto de motel, a forma em que tudo se deu ainda o choca, mas a falta de pistas e informações o deixa completamente perplexo. O que estava acontecendo nessa cidade? Por que tantos casos deixados em aberto? 


Já se aproximava das 11:30 quando o jornalista decide que irá retornar ao kitnet que ele está alugando enquanto faz a sua investigação. A distância é de 1,7 km entre o parque e o local em que Rafael está, serão aproximadamente 23 minutos de caminhada. 



Antes de se tornar jornalista, Rafael trabalhou como assistente de detetive, na época, recém formado no ensino médio e sem nenhuma noção do que queria fazer da vida, seu pai lhe arranjou o emprego com um velho amigo. No tempo em que ajudou o detetive, na maior parte do tempo, a função de Rafael consistia em perseguir seja lá quem ele fosse designado a seguir, na sua maior parte maridos e esposas infiéis. Essa experiência como assistente de detetive ajudou-o em dois grandes quesitos na sua vida.

  1. Ele descobriu uma paixão pela investigação; e por isso decidiu se formar em jornalismo e se especializar em jornalismo investigativo.

  2. Uma intuição lapidada; 


É difícil de explicar, nem mesmo Rafael sabe como elucidar o que sente, mas seu instinto aguçado o faz perceber pequenos detalhes, seja nas pessoas ou no ambiente a sua volta. 


Suspeitos que poderiam lhe indicar um fechamento para seus casos não faltavam, por hora, uma delegada estava na sua lista, Vanda! 


A mesma porém parecia inacessível, sempre indisponível para conversar com ele, contudo, nesse exato instante, algo mais o chama atenção à sua volta. Ele ainda não pode afirmar, mas enquanto ele faz seu caminho de retorno para seu kitnet, ele pode sentir que alguém o persegue. 




Rosa havia deixado sua moto no estacionamento do parque, lá é gratuito e há um grande número de guardas, claro que isso não era garantia de nada, mas sua decisão de ir atrás do jornalista era maior do que o medo de perder mais uma moto.


A mulher tenta disfarçar sua perseguição, na maior parte do tempo mantém uma distância de 3 metros para assim ter tempo de agir, se misturar ou se esconder caso o jornalista se volte para trás e a olhe. 


Após 15 minutos de perseguição, Rosa percebe que o jornalista começa a diminuir a velocidade de sua caminhada e entra em uma cafeteria. Agora já era quase hora do almoço e a cafeteria estava praticamente vazia. A loja possui grandes janelas por toda sua fachada, o que possibilita uma boa visualização de todo o espaço do salão pelo lado de fora. Se aproveitando disso, Rosa decide cruzar a rua e manter-se a observar a loja e cada movimento do jornalista dentro da mesma de uma distância mais segura.  



Rafael observa o balcão, depois o cardápio, ele pede um café pequeno para viagem, mas quando recebe seu pedido, ele não sai da loja, ele se senta em uma das cadeiras e começa a se atentar a tudo e a todos a sua volta. Objetos, roupas, cheiros, rostos. Ele sabe que de início ele não poderá apontar ninguém ali como o seu seguidor misterioso, nesse momento se tratava apenas de reconhecer o que está a sua volta e se aproveitar disso num outro momento. Após observar a todos que estão dentro da cafeteria com ele, o jovem jornalista se concentra na rua, as grandes janelas translúcidas facilitam seu trabalho. Por razões óbvias ele não repara muito naqueles que passam andando pela sem nem mesmo olharem para dentro, contudo ele tenta fixar pelo menos um pequeno detalhe de cada pedestre, pois caso o mesmo detalhe fosse visto por mais de uma vez, isso poderia significar que alguém estaria indo e voltando pelo mesmo caminho, esperando que ele saísse da loja para prosseguir sua perseguição; ele mesmo já havia usado essa técnica várias vezes, na maioria das vezes ninguém repara no número de vezes que um mesmo estranho passa por si na rua. 


Seu olhar então é chamado para uma mulher de cabelos castanhos, que apesar de não manter seu olhar fixo para a loja, age de forma estranha. A moça de alta estatura está do outro lado da rua e repetidamente vira-se brevemente para olhar a vitrine de uma loja de cosméticos, mas logo torna a mirar para a cafeteria em que Rafael está. O jornalista não a reconhece, não sabe quem ela pode ser, mas desconfia que ela pode ser a sua perseguidora. Decidido a constatar sua hipótese, ele se levanta da mesa e segue sua caminhada. Ele agora não mais caminha para seu kitnet, mas anda completamente sem rumo pela cidade, cruzando sinais desnecessários e virando esquinas aleatórias. Paradas estratégicas são feitas, geralmente em frente a uma loja ou em bancas de revistas, tudo apenas para que ele tivesse a chance de observar se encontrava algum detalhe que lhe remetesse a alguém mais da cafeteria ou se realmente só veria a misteriosa moça. 


Nas primeiras breves paradas no caminho, Rosa conseguira se manter numa distância segura para não ser detectada pelos olhares de canto do jornalista, mas num certo momento, ele conseguiu vê-la pelo reflexo do espelho de um prédio comercial com faixada espelhada. A química porém disfarçou, pegando seu telefone para fingir que falava com alguém. A segunda vez que Rosa caiu nos olhares de Rafael foi quando ele parou de andar, simplesmente se manteve estático num sinal de trânsito, Rosa acabou tendo que atravessar após ele não se movimentar quando o sinal se tornou verde para os pedestres. 


Rafael não precisava de mais provas, ele tinha que reconhecer que Rosa era boa, mantinha sempre uma boa distância e estava sempre pronta para improvisar um disfarce, se ele não fosse quem é, ele sabia que a teria levado diretamente para seu endereço… Rosa, no fundo estava contanto com isso, mas após 30 minutos de caminhada que não parecia dar em lugar nenhum, a mesma percebeu que poderia ter sido descoberta.



Isso era algo que ela não estava acostumada, normalmente ela conseguia perseguir seus alvos numa facilidade imensa e descobrir detalhes minuciosos sobre a rotina deles, mas ao que tudo indica sua experiência pouco importava agora, Rafael não é igual a seus alvos. Ela teria que mudar de estratégia. 


Rafael vira mais uma esquina, a rua é sem saída e é constituída por pequenos prédios familiares, esta é uma área muito valorizada da cidade, pois é uma rua bem tranquila, mas fica bem próxima ao burburinho da parte central da cidade. Distraída demais em construir um novo plano, Rosa não percebe que cairá numa armadilha.



Rafael para de andar assim que virar a esquina, preparado para flagrar a sua perseguidora e confrontá-la.  

Rosa, ao virar a esquina, dá de cara com o jornalista. Com o susto, ela para de andar, seus olhos se arregalam e o jornalista sorri, vitorioso. 

– Posso saber porque você está me seguindo? - Rafael pergunta num tom educado.



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Continua...


sexta-feira, 11 de dezembro de 2020

Capítulo 3 - O Filho Perdido (A Origem de Lincoln Campbell)


Não havia muito tempo para melhores explicações, Rosalind ainda tentava digerir a fuga dos agentes da SHIELD quando tem que lidar com o ataque num hospital. Durante o percurso Luther tenta lhe descrever o que aconteceu no vagão enquanto ela atendia a chamada, mas quando ele diz algo sobre uma mão protética, explosão controlada e container voador Rosalind se pergunta se o companheiro de time está bem da cabeça, não tinha como ele colocar isso no relatório da missão.


Quando Rosalind e sua equipe chega ao hospital que sofrera o ataque, os humanos modificados já haviam escapado. A enfermeira que havia chamado o socorro revela aos agentes que um dos modificados, responsável por parte da destruição deixada para trás, na verdade trabalhava como enfermeiro no hospital. 


A equipe então levanta a ficha do tal enfermeiro e quando Rosalind olha para a foto do humano modificado na tela do computador, ela, pela primeira vez em anos, não sabe o que fazer. Uma mistura de medo, raiva, confusão, alegria e tristeza inundavam seu coração. 


Claro que ele não estava igual da última vez que o vira, anos haviam se passado, o mesmo agora tem uma barba rala, o cabelo está mais arrumado e não mais rebelde como quando na adolescência, mas continua no mesmo tom castanho claro. Ele agora não é mais um jovem universitário, mas um homem. Ainda assim, mesmo que anos se passassem, Rosalind jamais iria se confundir. 


Aquele enfermeiro. Aquele humano modificado que aparece na imagem é o seu filho perdido.


Rosalind tinha que agir rapidamente. A sua equipe esperava isso dela, o presidente espera isso dela, suas mãos estão atadas, e neste momento a missão se tornara pessoal demais. Deveria ela revelar isso ao presidente? Mesmo Rosalind sendo chefe da U.A.C.A., o presidente deveria ser informado de tudo que acontecia na agência, o sucesso na contenção dos humanos modificados que por muitos eram considerados ameaças era importante para que o presidente mantivesse sua popularidade, porém se ela o contasse, a sua posição de liderança nesta força tarefa poderia ser comprometida e mais uma vez o filho lhe escaparia pelas mãos. Deveria ela esconder ele de tudo e de todos? Rosalind sabe que para isso teria que burlar leis e várias regras que por ela mesmo fora estipuladas e necessitaria da ajuda de mais algum agente, provavelmente Banks, mas este seria um movimento tão arriscado quanto a primeira ideia. 


Lincoln precisa ser resgatado, Rosalind deve isso a ele. Nesse momento da sua vida, após ter perdido tanto, talvez até mesmo tudo, ela percebe que foi uma mãe ausente. Se ela o capturasse e o levasse para a U.A.C.A., seu filho poderia ser curado, poderia voltar a ser seu garoto, e quem sabe até mesmo ele a perdoria?

– Price… Price… - a voz de Banks a acorda de seus devaneios. – Está tudo bem? - o agente pergunta, pois percebe que a chefe parece um pouco desorientada. 

– Sim. - Rosalind ajusta a sua postura e respira fundo, recompondo-se. – Só está sendo um dia cansativo. - ela não mente. 

– O que você deseja que façamos? - pergunta e enquanto ela pensa ele segue falando. – Recuperamos mais algumas imagens da câmera de vigilância, no total eram quatro modificados, ou pelo menos três…

– Como assim “pelo menos”? 

– Bom, temos o enfermeiro, que não temos nenhuma imagem dele em ação, mas temos uma testemunha; tem uma mulher, ela veste um uniforme, provavelmente se acha uma heroína, talvez queira se inscrever para uma seletiva dos vingadores. - Banks dá uma risadinha desdenhosa, mas Rosalind se mantém séria, o que o faz voltar a seriedade instantaneamente. – Tem um homem negro, alto e muito forte, ele estava junto a mulher de uniforme, meu primeiro pensamento é que ele também era um modificado, mas ele usava armas normais, ou ele tem um poder bem inútil ou ele é um humano. - Banks segue. - Também tem um ser monstruoso, nem sei dizer se aquilo pode ser considerado um humano, mas sem dúvidas é bem modificado... Ele é o responsável pelos buracos na parede, ao que tudo indica ele faz… Buracos. - finaliza e Rosalind tem um estalo, só poderia ser isso! 

– Você disse buraco? - pergunta para ter certeza de que sua ideia não é absurda. 

– Sim, posso te levar até um desses buracos.



Rosalind observa o buraco feito na parede de um corredor que dava para dentro de uma sala de consulta, a borda quase num círculo perfeito com uma margem escurecida envolvendo-o, como se algo tivesse sido queimado. O buraco é grande, uma pessoa de 1,70 m poderia passar pelo mesmo sem a necessidade de se esquivar. As proporções são claramente bem maiores, mas os aspectos muito se assemelham, Rosalind não crê em coincidências, só poderia ser esse ser monstruoso o causador das mortes que ela até então culpava serem causadas pela SHIELD 


– É o mesmo. - ela diz.

– O mesmo o que? - Luther pergunta ao seu lado. 

– Esse monstro que fez esse buraco é o mesmo que está fazendo os buracos no peito dos humanos modificados que estamos encontrando. - Rosalind exclaresse. 

– Você tem certeza?

– Claro!

– Então aquela coisa trabalha para a SHIELD? - pergunta.

– Não. - Rosalind não hesita. – Eu acredito no Coulson.

–  Então devemos atacá-lo? 

– Eu preciso falar com a enfermeira, a que viu meu… o enfermeiro. - Rosalind ignora a pergunta de Banks e quase fala mais do que deveria. – a que viu o enfermeiro. - se concerta. Banks não parece gostar muito da resposta da chefe, mas a acata sem perguntar duas vezes.

– Vou providenciar um local para que vocês possam conversar. - diz se retirando e deixando Rosalind ali, devaneando sobre seu filho e em como ela poderá recuperá-lo. 


Um dos poucos locais que não foi atingido pela confusão causada pelos humanos modificados é a ala da UTI do hospital. Rosalind, em condições normais, não teria a permissão de entrar ali, mas uma exceção é concedida a ela e no canto, bem perto da porta de entrada, duas cadeiras são dispostas frente uma da outra, Rosalind senta numa e a enfermeira que testemunhara Lincoln usando seu poder, se senta na outra. Seu nome é Christina e mesmo após horas do ataque, suas mãos seguem trêmulas. 


– Você disse que o enfermeiro tinha poderes, você tem certeza que era ele e não os outros que estavam com ele que usou poder? - pergunta, após se apresentar e tentar, inutilmente, acalmar a mulher. 

– Sim… Era uma luz forte, saia da mão dele. - garante.  

– E porque você acha que ele fez essa bagunça no hospital? Houve alguma briga que pudesse tirá-lo do controle? - Rosalind sabia do temperamento nada calmo do filho, com poderes ele poderia muito bem causar um belo de um estrago quando fosse contrariado. 

– Não… Ele sempre foi muito bom, gentil… Calmo. - Rosalind estranha a descrição, será que ele havia mudado tanto? – Foi a coisa… O monstro que veio atrás dele… Quer dizer, ele perguntou sobre um… não humano… quer dizer… foi outra palavra… Inumano, acho que foi essa a palavra que ele usou. - diz forçando-se para lembrar exatamente o que escutara. 

– Inumano? - Rosalind nunca havia escutado aquela expressão. – Então você acha que o monstro estava atrás do Lincoln, para… matá-lo? - A última palavra engasga em sua garganta antes de ser dita, a ideia de perder seu filho novamente é intolerável. 

– Acho que sim, o enfermeiro Lincoln, o homem e a mulher estavam lutando contra a coisa. - responde. 


Aquilo era tudo o que Rosalind precisava escutar, ela deveria agir ainda mais rápido do que planejara. Ela teria que utilizar de todas as suas forças e meios para recuperar seu filho, pois agora ser um humano modificado não era o seu único problema, ele também estava sendo perseguido por uma maquina de fazer buracos mortais. 


Enquanto retornam para a base da U.A.C.A., Rosalind lista para Banks todo o seu plano de ação.

– Preciso de uma força tarefa, desloque todos os homens disponíveis se for preciso, use de toda nossa inteligência para que o enfermeiro seja encontrado, monitore todas as câmeras, cubra todas as saídas, quero cada passo que ele tenha dado. 

– Senhorita Price… - Banks a interrompe com cuidado. – Não deveríamos estar atrás do monstro? - pergunta. Rosalind engole o seco. 

– Eu sei o que estou fazendo. - diz mantendo a pose de superioridade, relembrando a Banks o seu lugar na hierarquia da agência. O careca apenas assente, entendendo o recado. 

– Assim que localizarem devemos agir rápido, não podemos deixar que ele escape e, por nada, mas por nada nesse mundo o alvegem. - ela ordena com veemência. – As armas que forem usar não poderão serem letais, apenas armas para imobilizá-lo, e ainda assim, só atirem em último caso. - volta a exigir. – Eu o quero vivo! 



A noite já estava quase se tornando madrugada, Rosalind observa de perto Banks recrutar dezenas de agentes de campo para uma captura que poderia ocorrer a qualquer momento, toda a inteligência da U.A.C.A. estava focada em encontrar apenas uma pessoa, todos sabiam que isso parecia loucura, nunca Rosalind se esforçara tanto por apenas um humano modificado, mas todos acatam suas ordens e rapidamente trazem os primeiros resultados. 


– Senhorita Price! - o estagiário corre para alcançá-la meio ao galpão subterrâneo, lotada de agentes e carros equipados preparados. – Temos uma localização! - ele segura um papel com a mão no alto, empolgado com a noticia. – Encontramos o Lincoln.




terça-feira, 8 de dezembro de 2020

Capítulo 5: O Segredo de Rebecca (Parte 3) (Secrets)




Rebecca pensa por alguns segundos.


– Como você sabe que meu pai faliu? - ela pergunta e Lucas ri e se faz de difícil.

– O que você tem para me oferecer? - pergunta.

– Lucas. - ela pede. – Por favor, me responda. - Lucas se mantém firme e Rebecca acaba cedendo.  – Tem chá e suco. 

–  Assim que eu gosto. Mansinha. - continua sorrindo. –  Suco. Com adoçante. - exige e Rebecca bufa.



Após se retirar da sala e ir até a cozinha da cobertura, que tem bancadas de mármore banco e uma grande geladeira, onde ela encontra a jarra de suco de uva. Logo após ela enche um copo de cristal, pega o pequeno pote de adoçante e retorna para sala. A garota entrega o copo com o suco e o adoçante para Lucas sem muita delicadeza, mas ele não parece esperar nada diferente da garota. 

Rebecca então se senta no sofá de frente a ele e espera que o rapaz comece a falar.


– Eu estou ajudando meu pai na empresa dele. - Lucas começa, sem nem mesmo dar um gole do copo de suco. –  Afinal de contas, herdarei o império dele. - diz orgulhoso e Rebecca revira os olhos.


–  Vá direto ao ponto. - Rebecca pede.


– Para uma pobre você exige muito. - Lucas responde. 


– Sua ajuda é essa? Me humilhar?


– Eu não estou te humilhando. - Lucas não gosta da fala da moça. – Que seja. - ele então decide dar de ombros. – Seu pai apareceu na minha futura empresa hoje, ele tinha uma reunião com meu pai e eu pude participar. Seu pai foi pedir ajuda, queria que meu pai o emprestasse dinheiro, para que ele pudesse se reerguer.


– E seu pai o fez? - Rebecca pergunta ansiosa.


– As fábricas de seu pai estão completamente paradas, não há um funcionário que não esteja há pelo menos quatro meses sem receber o salário; ele tem quatorze processos trabalhistas correndo em segredo de justiça, e que provavelmente vai perder... Emprestar dinheiro para seu pai se reerguer seria jogar dinheiro fora. - Lucas diz e Rebecca fica sem ação. – Não me leve a mal, Rebecca, mas seu pai se permitiu chegar a esse ponto, e não cabe ao meu pai reergue-lo.


– O que você quer então? - Rebecca perguntou sem conseguir olhar nos olhos do garoto a sua frente.


– Eu venho cuidando de um negócio, próprio meu, para conseguir um dinheiro extra. Tenho ganhado bem, e creio que posso lhe contratar com um salário bem alto, maior que a média.


– Negócio próprio? Você nem se formou ainda. - Rebecca desdenha.


– Eu sou um empresário nato, está no meu sangue. - Lucas diz confiante. – Meu pai também começou pequeno e olha tudo o que ele conquistou… - Rebecca suspira, ela sabe que a relação de Lucas com o pai sempre foi conturbada e que o garoto apenas o enaltece agora para humilhar Rebecca ainda mais.

 

– E porque você faria isso? - ela pergunta desconfiada. – Me ajudar?


– Porque eu preciso de ajuda, e você precisa ser ajudada. Simples.


– E o que seria? O que eu devo fazer?


– Entregas. - responde simples.

– Entregas? - ela quer saber mais. – Para isso existem motoboys, chofer, correios, coisas do tipo...


– São entregas especiais. Não posso deixar na mão de qualquer um.


– Especiais? - Rebecca não confia no garoto.


– É tudo o que você precisa saber.


– Eu preciso saber o quê estou entregando.


– Você precisa de dinheiro, Rebecca, é disso que você precisa. - Lucas contrapõe.


Rebecca não é boba, ela sabe que se aceitar a proposta de Lucas estará entrando em uma encrenca. Mesmo tendo se permitido relacionar com ele por breves semanas (e até se apaixonado por ele), ela sabe bem que nada do que vem dele é algo bom. Mas se o pagamento for real, ao recusar a proposta do garoto, ela também estará encrencada. Naquele momento ela não tinha nenhuma saída. 

– E eu posso lhe pagar um adiantamento ainda hoje, basta você parar de fazer perguntas e aceitar minha proposta. - Rebecca segue cautelosa. O que seria pior? Ficar pobre ou sabidamente entrar em uma encrenca?


Rebecca olha para o relógio pendurado na parede que fica atrás de onde Lucas está sentado. Agora já se passa das cinco e meia da tarde, ela ainda pode voltar à loja de roupas em que seu cartão fora negado e salvar seu nome, mas para isso ela teria que ser rápida.


– Já se decidiu? - Lucas a pressiona.


– Você pode me adiantar um valor ainda hoje? - ela pergunta.


– Foi o que eu disse. - ele responde.


– Você pode me adiantar um valor agora? - ela se especifica e Lucas gargalha e suspira satisfeito.


– Você pode começar ainda hoje? - ele pergunta.


– O dinheiro primeiro. - ela insiste.


[...]



Os dois já haviam ido à loja para pagar a dívida de Rebecca e já haviam voltado ao apartamento da menina; agora ela se aprontava para seu primeiro dia de trabalho. Lucas não deu muitos detalhes, mas disse que ela deveria se vestir como se fosse a uma festa de luxo, porém com a roupa um pouco mais provocante. Elegante porém sexy.


Rebecca se veste e se maquia da melhor maneira possível, mesmo tendo salvado seu nome das más línguas da loja, nem tudo estava resolvido, ela ainda está preocupada com seu pai, que ainda não deu sinal de vida.


A garota veste um vestido preto de seda, ele é longo e possui um longo decote que vai até quase seu umbigo. Por já estar de noite, ela não economiza na maquiagem, apesar de Lucas ter deixado subentendido que essa parte não era tão necessária. Base, sombra, cílios postiços, batom vermelho vinho que fazem sua boca parecerem mais carnudas e delineador feito com perfeição. 

Ao vê-la assim, Lucas assobia.


– Maravilhosa.


– Eu sei. - ela responde e o garoto ri.


[...]


– Sorria, Rebecca. - Lucas ordena assim que os dois chegam a um prédio de dois andares, escuro, sem nenhuma identificação além do número 305. A fachada simplória deixa o lugar escondido e passa despercebido na avenida movimentada e iluminada.


– Tem certeza que é aqui? - Rebecca pergunta nervosa.


Sim, desde o início ela sabia que estava entrando numa roubada, e ela aceitou apenas para limpar seu nome, salvar sua reputação enquanto seu pai arranja uma forma de se reerguer, porém, a total falta de informação sobre o que deve fazer, combinado com a lugar estranho que Lucas está a levando, a deixou mais apreensiva do que ela gostaria de estar.


– Claro que sim. - diz, abrindo com um forte empurrão a grande porta cinza escuro, que parece ser feita de algum metal maciço. Os dois passam por um corredor escuro. Ao percorrer o corredor, Rebecca vê que no fim há uma cortina de panos leves, que se esvoaçavam e revelavam uma música alta e animada e um jogo de luz intenso. Parece se tratar de uma boate secreta.


– O que tenho que fazer agora? - ela pergunta.


– Coloque isso. - ele pede, aparecendo do nada com uma máscara veneziana, da cor preta, com brilhos na borda e algumas plumas no topo. Era exagerado para o gosto de Rebecca, mas ela não podia negar que era uma máscara bonita. Rebecca faz uma careta. – Eu disse que não precisava de tanta maquiagem. - Lucas a lembra.

– Não podia ser uma máscara mais simples? Que não escondesse tanto minha maquiagem?

– Não. - responde seco.


– Por quê? - ela questiona.


– Apenas faça. - Lucas começa a se irritar com as perguntas de Rebecca. – Eu fiz minha parte, não fiz? - Rebecca assente. – Então agora cumpra a sua. - ordena.


Rebecca coloca a máscara na face e Lucas a ajuda a amarrá-la atrás da cabeça da garota.


Após ajustar a máscara ao rosto, Rebecca suspira, se preparando para o que enfrentará após adentrar ao local.


É um grande salão, com pilastras no entorno, sem janelas aparentes e um pé direito bem alto, parece ser um lugar bonito, mas as luzes dançantes não permite que a garota capte os detalhes de imediato. Há muita gente, o público presente é principalmente de homens. Homens maduros, velhos, nenhum aparenta ter menos de 30 anos, a maioria parece ter saído de seu trabalho e vindo direto para cá, pois vestem ternos e trajes sociais. Há um bar extenso, onde garçons correm para atender a todos os clientes, há um palco grande, onde há um poste de fazer pole dance bem no meio, e do palco se estende uma passarela em formato de “T”, não há ninguém lá agora.


Mulheres, em trajes curtos e justos se jogam nos braços dos homens e os acariciam. A menina logo percebe que as mulheres também usam máscaras venezianas, cada um tem um estilo, algumas coloridas e bem extravagantes, outras mais simples, mas sempre de máscara.


– Você não quer que eu... - Rebecca grita, mas Lucas a interrompe.


– Não, Rebecca, você fará entregas, apenas isso. Eu ficarei no bar e você chegará nos clientes que eu indicar, e entregará as encomendas da maneira mais discreta possível.


–  E quando você diz: discreta...


– Sim, você vai agir como essas meninas, mas não será uma delas. - Lucas garante.


Rebecca suspira.


– Eu já lhe paguei. - ele relembra.


– Eu sei. - ela cerra os dentes. – Eu sou uma traficante agora. - ela bufa. – Não é? - pergunta.


Lucas poderia ter mantido segredo sobre seu negócio até aquele momento, mas Rebecca é esperta e aos poucos estava juntando os detalhes. Ela agora sabe do que se trata e o confronta.


– Sim. - ele não nega. – E é melhor você começar a fazer seu trabalho rápido. Pois do mesmo jeito que eu lhe contratei, posso lhe despedir. - ele diz e Rebecca estremece pelo tom de sua voz.


– Isso é temporário. - ela diz e Lucas ri.


– Eu não me importo. - ele dá de ombros. – Só faça seu trabalho.


– Ninguém pode saber disso. - ela fala.


– Eu te mato se você falar disso para alguém. - Lucas ameaça.


E ali fez-se um acordo. Este era o segredo de ambos... Porém não é o único segredo de Lucas...


segunda-feira, 7 de dezembro de 2020

Capítulo 7: Sorte (Red Blood Lipstick)



Sofia não tem uma boa noite de sono, uma nova tensão toma conta de si e faz com que sua mente e corpo fiquem inquietos. Ela teme pelo futuro da ONG, pela segurança dela e das amigas de grupo e também pelas decisões que deveria tomar amanhã logo cedo. Lisa havia lhe enviado uma mensagem ainda pela noite, enquanto a enfermeira ainda estava no estacionamento do bar com Felipe; a mulher de aparência frágil e desejos sádicos lhe informou que sua investigação a respeito do Jornalista já havia sido finalizada, logo cedo as duas se encontrariam no ONG para avaliar as descobertas. 

– Está tudo bem, filha? - o pai de Sofia aparece na pequena cozinha deles. Por ter se revirado na cama na tentativa de dormir o cabelo cacheado de Sofia estava totalmente emaranhado; ela usa um pijama de calça de moletom rosa e uma blusa cinza que não fazia parte de um conjunto de pijama, e que na verdade era de seu pai e ficava tão largo que provavelmente caberia três sofias dentro da mesma. O pai de Sofia, senhor Elias, estava com um pijama de calça comprida e blusa de manga longa, da cor azul marinho, a enfermeira havia lhe presenteado esse mesmo conjunto há dois anos nos dias do pais. 

–  Sim, pai. - Sofia sorri fraco, ela sabe que deveria estar dormindo, que provavelmente estará morta de cansaço no dia seguinte, mas o sono parecia estar com raiva dela, e por isso ela havia ido para cozinha e preparado um chá de camomila para tomar, como um último recurso de obrigar o corpo a descansar. –  Só estou com insônia. - o pai se aproxima e dá um beijo carinhoso no topo da testa da filha, que naquele instante até parece esquecer suas preocupações, seu pai sempre tem esse efeito nela. –  E o senhor? Porque está acordado?

–  Sede. - ele responde, pegando um copo que estava no escorredor em cima da bancada da pia. –  Venho tendo muita sede ultimamente. - ele pega uma garrafa de água na geladeira e serve seu copo. 

– Eu já disse que você deveria me fazer uma visita no hospital… Seria bom fazer um check-up. 

– É só uma sede, filha, não há nada de mal em beber água… Bom que fico hidratado. - ele brinca e Sofia acaba rindo, mesmo sabendo que o pai deveria levá-la mais a sério. –  mas me diga, filha, porque você está com insônia? Algum problema no trabalho?  


Elias não sabia tanto quanto deveria sobre o trabalho da filha, só o fato de ela ter conseguido se formar já era razão o suficiente para ele se sentir orgulhoso, qualquer outro feito da filha era mais um bônus, algo a mais para ele poder se gabar entre os amigos. A única razão pela qual Sofia podia se manter presente na vida do pai e ainda ajudar Vanda na ONG é por causa da total falta de conhecimento sobre o que Sofia faz ou sobre os seus horários, o que deveria ser comum, normal ou não para uma enfermeira-chefe.

– Muitas decisões para serem tomadas… É difícil. - nesse momento Sofia não estava falando sobre seu trabalho no hospital, apesar do grande cargo que ocupa, comandar as enfermeiras era uma trabalho bem fácil, todas ali tinham objetivos bem nobre e comunhão de ideias, já no grupo da ONG, por mais que as quatro mulheres lutassem por uma mesma causa, as formas de agir e a forma de ver a vida muito se diferenciava, manter todas em controle e garantir que ninguém fosse ultrapassar limites é algo que ela não sabia se conseguiria fazer por muito tempo.  

– É o seu trabalho, você não alcançou esse cargo atoa.

– Eu sei, mas… 

– Filha, se você não quiser me dizer exatamente o que está acontecendo, tudo bem, mas eu quero deixar algo claro para você. - o homem se senta ao lado da filha e garante que ela o olhe nos olhos. – Não hesite tanto em fazer algo que você quer fazer, acredite na sua intuição! Erros vão ser cometidos por todo mundo, não deixe que o medo de errar te impeça de mostrar seu potencial. Você não passou por tudo o que passou para parar agora. - Sofia absorve cada palavra dita por seu pai, por mais que ele não soubesse sobre todas as suas dúvidas e dilemas, suas palavras podem lhe vir a calhar. 

– E se uma decisão minha prejudicar alguém que não merece? - Sofia pergunta, ela ainda não sabe o que Lisa irá lhe revelar ao amanhecer, mas ela sente por dentro que provavelmente não será o que ela espera ou deseja: Uma razão para matar o jornalista. 

– Você nasceu para fazer o bem, Sofia, para ajudar. - o pai diz. –  Se você deve fazer algo que cause sofrimento em alguém, pense bem… Será mesmo que não há outra saida? 



A fala do pai de Sofia era o que ela precisava para decidir o que fazer, mas isso tampouco deixou sua noite de sono mais calma, tudo o que ela conseguiu foi tirar um breve cochilo antes do seu despertador a acordar as 6:30 da manhã. 


Antes de ir para o hospital, Sofia faz uma parada na ONG. Vestida com uma calça jeans, uma blusa de cetim verde esmeralda de mangas grossas. Seu cabelo, como quase sempre quando está fora do hospital, está solto e seus cachos estão volumosos e definidos.


Já na entrada a enfermeira encontra Lisa. A mulher usa um vestido estilo pin-up, de fundo vermelho e bolinhas brancas com um decote coração, quando a mesma não está em missão ou no seu trabalho no necrotério, ela gosta de usar vestidos nesse estilo; seus cabelos pretos e curtos, hoje chegam a brilhar de tão bem hidratado; usando quase nada de maquiagem além do seu já tradicional batom vermelho nos lábios, suas sardas envolvem toda suas bochechas. Nas suas mãos ela segura uma pasta com aba elástica da cor preta. Provavelmente, ali há todas as informações coletadas sobre Rafael, o jornalista. Fazer fichas como essas, com todas as informações possíveis do alvo é algo comum entre as mulheres, assim elas poderiam estudar a melhor forma para atacar, os pontos fortes e fracos e vários outros dados que venham a ser preciso sobre o alvo. 


Quando Lisa e Sofia se encaminham para a sala de reunião, encontram com Rosa no meio do caminho, ela vem do escritório onde Vanda fica. Ao se depararem ali, as três se entreolham confusas, não havia nenhuma reunião marcada, portanto, não havia nenhuma razão para que a maior parte do grupo estivesse ali. 

– Está acontecendo alguma coisa? - Sofia é a primeira a perguntar se direcionando a Rosa, que hesita em responder.

– Vim conversar com Vanda. - Rosa responde por fim. – Ela me chamou… Para fazer um pedido. 

– Pedido? - Lisa questiona. 

– Ela precisa de alguns medicamentos… Ela tem uma missão pessoal. - se explica. 

– Uma missão pessoal? - Sofia suspeita. 

– Ela não me disse muito, mas suspeito que possa ter algo haver com Vanessa.- Rosa confessa. Com sua inseparável jaqueta de couro preta, Rosa também usa uma calça jeans de cintura alta e uma blusa branca por debaixo da jaqueta. Seus cabelos estão amarrados num coque improvisado, que se mantém preso apenas por um lápis, uma bota de cano curto completa seu look. 


As três ali presentes ficam em silêncio absoluto por alguns segundos.

– Você acha que ela fará algo de mal a Vanessa? - Sofia pergunta. 

– Não sei. E... - Rosa parece se recompor e afastar de si o pensamento ruim. – Não deveríamos nos importar com isso, pois ela não se importou com a gente. - conclui. 

Sofia não concorda completamente com a fala da amiga, mas não discute. 

– E vocês? O que fazem aqui? - Sofia ainda está um pouco pensativa sobre a tal missão de pessoal de Vanda, mas Lisa, preparada, já revela a razão da reunião das duas.

– Tenho as informações sobre o jornalista. - diz, segurando a pasta preta próximo ao peito.

– Que ótimo, e porque não marcamos uma reunião com todas para falar sobre ele? - Rosa questiona. 


Lisa suspira antes de responder.

– Porque não há nada. - adianta o resultado final

– Como assim não há nada? - Rosa parece não acreditar.

– Não há nada, mal mal uma multa de trânsito. - Lisa também parece  frustrada com a descoberta, todas queriam que o jornalista tivesse algo em seu nome, talvez que ele tivesse assediado alguém, qualquer coisa que fizesse sua morte um pouco mais justificável. 

– Talvez Vanda ache algo, podemos falar com ela. - Sofia finalmente sugere. 

– Não acho que esta seja uma boa ideia no momento. - Rosa interrompe os planos da enfermeira. 

– E porque não? - ela questiona.

– Vanda está de malas prontas para uma pequena viagem, creio que parte ainda hoje. - revela. – Algo me diz que ela odiaria ter essa viagem interrompida por algo assim… Algo que nós podemos resolver. - finaliza. 

– Como você sabe de tudo isso? - Sofia começa a se incomodar com os níveis de informação que Rosa vem recebendo enquanto ela de nada sabe. 

– Relaxa, Sofia. - Rosa percebe o descontentamento da amiga. – Você é a líder interina, provavelmente ela iria te ligar ou te chamar para passar essas informações, talvez você receba até mais informações do que eu recebi… Vanda só precisava de mim primeiro e você sabe que eu não faço nada sem fazer muitas perguntas. - Rosa ri, deixando com que a tensão ali se torne mais amena. A enfermeira aceita a justificativa da moça a sua frente. 

– Bom… Então creio que o destino do jornalista deve aguardar o retorno dela. - ao terminar a frase Sofia sente como se tivesse tirado um grande peso do seus ombros. Entre todas, ela é a que mais se opõe a atacar qualquer pessoa que possa ser inocente. 

– Não concordo. - Rosa logo se posiciona. – E se ela demorar? E se ele agir antes? 

– Ele é inocente, não é como se pudéssemos fazer algo! - Lisa diz. 

– Não podemos matá-lo, infelizmente não poderemos usar Jane no nosso plano… E como ela mesmo disse, nenhuma de nós pode arrancar as informações necessárias melhor que ela… Mas Vanda pode arranjar uma razão para interrogá-lo.

– Para isso ele precisa ser suspeito de algo. - Lisa relembra o óbvio a Sofia. – Coisa que ele não é. 

– Por enquanto. - Rosa diz e abre passagem entre as amigas que estão à sua frente, rumando então para a saída.

– Rosa! - Sofia grita, chamando-a. – Não faça nada! - ordena. 

– Desejem-me sorte. - Rosa grita já ultrapassando a porta de entrada. 

– Eu não, tá doida? - Lisa diz em resposta, porém por não gritar, apenas Sofia, que está ao seu lado, a escuta. 

– Ela vai fazer merda. - Sofia lamenta.

– E você tem alguma dúvida? - Lisa não parece surpresa com a reação de Rosa, a mesma, apesar de sempre se demonstrar fria na questão sentimental, é bem impulsiva quando crê que algo deve ser feito, não pensa duas vezes, apenas age. – Você como líder deveria ir atrás dela, pelo menos para saber onde terá que apagar o fogo. - sugere. 


Sofia não pensa duas vezes antes de acatar a sugestão e vai em disparada atrás de Rosa.


A química já está no sua moto (uma diferente da que ela usou na última missão) quando Sofia a intercepta. 

– Rosa, você precisa parar agora!

– Sofia, sai da minha frente. - Rosa pede com educação, porém pouco paciente. 

– Você precisa pensar melhor no que vai fazer, você mesmo falou que a Vanda vai viajar, você não precisa agir agora. E se der errado? Quem vai te ajudar?

– Você vai me agradecer depois, só confia. - Rosa liga a moto e começa a dar pequenos solavancos com a mesma, abrindo passagem aos poucos, pois Sofia se vê obrigada a abrir espaço para que a motoqueira passasse e assim não ser atropelada. 

– E se der errado? - Sofia pergunta antes de dar o último passo que dará a total liberdade para que Rosa siga seu caminho.

– Só me deseje sorte. - Rosa repete e parte sai sem rumo pela tranquila rua familiar.